Até quando vamos endeusar a revolução farroupilha?

 

 

 

Até quando?

Todo os anos eu me pergunto: até quando?

Sim, até quando teremos de mentir ou omitir para não incomodar os poderosos individuais ou coletivos?

Até quando teremos que tapar o sol com a peneira para não ferir as suscetibilidades dos que homenageiam anualmente uma “revolução” que desconhecem? Até quando teremos de aliviar as críticas para não ofender os que, por não terem estudado História, acreditam que os farroupilhas foram idealistas, abolicionistas e republicanos desde sempre? Até quando teremos de fazer de conta que há dúvidas consistentes sobre a terrível traição aos negros em Porongos? Até quando teremos de justificar o horror com o argumento simplório de que eram os valores da época? Valores da traição, do escravismo, da infâmia?

Até quando fingiremos não saber que outros líderes – La Fayette, Bolívar, Rivera – outros países – Uruguai, Argentina, Chile, Bolívia – e outras rebeliões brasileiras – A Balaiada, no Maranhão, por exemplo – foram mais progressistas e, contrariando “valores” da época, ousaram ir aonde os farroupilhas não foram por impossibilidade ideológica? Até quando a mídia terá de adular o conservadorismo e a ignorância para fidelizar sua “audiência”?

 

Até quando deixaremos de falar que milhões de homens sempre souberam da infâmia da escravidão? Os escravos. Até quando minimizaremos o fato de que a Farroupilha, com seu lema de “liberdade, igualdade e humanidade”, vendeu negros para se financiar? Até quando deixaremos de enfatizar que os farrapos prometiam liberdade aos negros dos adversários, mas não libertaram os seus? Até quando daremos pouca importância ao fato de que a Constituição farroupilha não previa a libertação dos escravos? Até quando deixaremos de contar em todas as escolas que Bento Gonçalves ao morrer, apenas dois anos depois do fim da guerra civil, deixou mais de 50 escravos aos seus herdeiros? Até quando?

Até quando?

Até quando adularemos os admiradores de um passado que não existiu somente porque as pessoas precisam de mitos e de razões para passar o tempo, reunir-se e vibrar em comum? Até quando os folcloristas sufocarão os historiadores? Até quando o mito falará mais alto do que a História? Até quando não se dirá nos jornais que os farroupilhas foram indenizados pelo Império com verbas secretas? Que brigaram pelo dinheiro? Que houve muita corrupção? Que Bento Gonçalves e Neto não eram republicanos quando começaram a rebelião? Que houve degola, sequestros, apropriação de bens alheios, execuções sumárias, saques, desvio de dinheiro, estupros, divisões internas por causa de tudo isso e processos judiciais?

 

 

Até quando, em nome de uma mitologia da identidade, teremos medo de desafiar os cultivadores da ilusão? Até quando historiadores como Décio Freitas, Mário Maestri, Sandra Pesavento, Tau Golin, Jorge Eusébio Assumpção, Spencer Leitman e tantos outros serão marginalizados? Até quando nossas crianças serão doutrinadas com cartilhas contando só meias verdades?

Até quando a rebelião dos proprietários será apresentada como uma revolução de todos? Até quando mentiremos para nós mesmos? Até quando precisaremos nos alimentar dessa ilusão?

Até quando viveremos assim?

Por: Juremir Machado da Silva 

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Comments

imagem de atila de macedo maia

A Traição aos Lanceiros Negros.

Colaborando com o colega Paulo Marques, posto este excelente texto, esclarecedor da atuação das forças Farroupilhas e Imperiais ao final da Revoluçãpo Farroupilha.Contestado por muitos defensores de Canabarro, o documento escrito por Duque de Caxias para Moringue em 9 de novembro de 1844 dá instruções a Moringue, pede a ele que poupe “sangue brasileiro”, que dê fuga a Canabarro e avisa que as tropas estarão desarmadas, configurando prova da traição de Porongos. 

[…] Regule V. S. suas marchas de maneira que no dia 14, às duas horas da madrugada possa atacar as forças a mando de Canabarro, que estará nesse dia no Serro dos Porongos. […] No conflito poupe o sangue brasileiro o quanto puder, particularmente da gente branca da Província ou índios, pois bem sabe que essa pobre gente ainda nos pode ser útil no futuro. […] Não receia a infantaria inimiga, pois ela há de receber ordem de um ministro de seu general-em-chefe para entregar o cartuchame sob o pretexto de desconfiarem dela. Se Canabarro ou Lucas forem prisioneiros deve dar-lhes escápula de maneira que ninguém possa nem levemente desconfiar […]Nos momentos finais da revolução Farroupilha ocorreu o "Massacre de Porongos", em 1844, na zona rural de Pinheiro Machado, onde os "lanceiros negros" foram mortos pelas tropas imperiais.Mais uma vez se aproxima a data de 20 de setembro, comemorada no Rio Grande do Sul e pelo mundo afora como uma referência (e certa deferência) aos heróicos atos do exército farroupilha. Bem menos lembrada, mas nem por isso menos heróica, foi a participação de negros neste exército, organizado pela elite gaúcha, os ricos fazendeiros escravocratas do Rio Grande do Sul.Os lanceiros negros formavam uma tropa especial do exército farroupilha que foi decisiva em muitas batalhas travadas durantes os dez anos de guerra. Porém, segundo André Melo, especialista em História Contemporânea pela Fapa, "Engana-se quem pensa que realmente existiu uma democracia racial entre os farrapos. Os soldados até poderiam ser negros, mas os oficiais eram todos brancos."Por trás da participação dos negros havia a esperança da liberdade, a alforria, após a guerra. A participação dos negros terminou de forma trágica em 14 de novembro de 1844: a traição de Porongos, com o massacre dos lanceiros negros. Desarmados um dia antes por ordem de David Canabarro, os negros foram alvo fácil para as tropas do Império sob o comando de Francisco de Abreu, o Moringue.O triste acontecido foi durante muitos anos ocultado da nossa história. Até hoje, grupos ligados ao tradicionalismo negam o episódio, e acusam os historiadores de renegar o heróico passado farrapo. Porém cabe a cada um de nós, estudantes e pesquisadores, fazer lembrar o massacre e desta forma homenagear esses heróis anônimos da luta pelo fim da escravidão.A traição de Porongos e o massacre dos lanceiros negros é num dos mais lamentáveis episódios da história da humanidade.É uma façanha que não orgulha, nem serve de modelo para nenhuma terra.

FONTE EXTRAÍDA DO BLOG CLIO DE ESTEIO: http://clio-esteio.blogspot.com.br/2012/09/repostagem-oportuna-traicao-a... 

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imagem de João Carlos Moraes Perdigão

Revolução Constitucionalista de SP é parecido

Em São Paulo, através do século XX, muita coisa errada já foi falada sobre a Revolução Constitucionalista de 1932...Quem disse que foi um movimento separatista e pronto?

Vamos estudar, gente?

 

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