Para evitar exclusão escolar, Argentina cria escola para travestis

Olá, pessoal

Segue aqui uma matéria sobre a inauguração da primeira escola para travestis e transsexuais da Argentina. O nome da escola é Mocha Celis, em homenagem a um travesti que foi brutalmente assassinado em Buenos Aires.

Quando eu li o título dessa matéria, a primeira reação foi dupla: "nossa, que estranho!" e "uau, que bacana!". Os motivos que me levaram a pensar nessas coisas ao mesmo tempo e também a razão para postar essa matéria eu encontrei ao longo dos depoimentos, vejam só:

"Por um lado não me parece correto que tenha que existir uma escola a parte, porque isso significa que a sociedade faz com que nos afastemos do que é o estabelecimento escolar masculino/feminino. E por outro lado, eu acho ótimo, porque eu me sinto confortável, estou com meninas que estão na mesma situação que eu", diz Solange Fabian, uma das alunas.

"Nós também defendemos e queremos a escola pública, mas vamos obrigar outra vez, talvez por uma sexta ou sétima vez, as estudantes a voltarem para uma escola que vai expulsá-las novamente?" por  Francisco Quiñones, um dos coordenadores da escola.

Fica a matéria na íntegra aqui embaixo e seguimos nessa discussão. O que vocês acham dessa "separação"? Será que movimentos assim vão gerar a representatividade necessária ou viveremos numa eterna exclusão?. Eu acho que isso pode dar um resultado bom no futuro sim, porque se pessoas consideradas à margem não se orgnanizassem de alguma maneira, talvez muitas das mudanças que tivemos no mundo nunca tivesse ocorridos. 

Seguimos dialogando! Abs, Marina.

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Mocha Celis foi um travesti que ficou conhecido no bairro de Flores, em Buenos Aires, Argentina, devido à brutalidade de sua morte. Ele teria sido assassinado por um sargento das redondezas com três tiros na cabeça. O caso gerou revolta por parte do movimento Trans e causou grande mobilização da comunidade LGBT. Esse personagem serviu de inspiração para a primeira escola de ensino médio do país direcionada a travestis.

O projeto começou durante uma conversa informal entre os atuais coordenadores da escola, Francisco Quiñones e Agustín Fuchs. Ambos já tinham experiência na área do cooperativismo e da educação popular. Em 2011, arregaçaram as mangas e resolveram convocar os ativistas do movimento argentino para inaugurar a primeira escola voltada a atender o público. "Chegamos à conclusão de que seria ótimo poder montar um projeto de escola inclusiva para a população Trans e assim nasceu a Mocha Celis", recorda Francisco, ao destacar a necessidade de evitar a exclusão dessas pessoas da educação formal.

Inesperadamente o apoio veio de muitos lados, como da Fundação Diversidad Divino Tesoro, que fornece apoio jurídico para regularizar a instituição junto ao governo da cidade de Buenos Aires. Ou ainda, a Mutual Sentimiento, do bairro de Chacarita, zona norte portenha, que cedeu um dos andares do seu prédio para a instalação da escola.

Os recursos para a escola vieram do bolso dos idealizadores, que investiram cerca de R$ 6 mil somente para a inauguração. A manutenção também tem sido bancada por eles. Somente com o aval da prefeitura será possível solicitar recursos para pagar os professores, os quais trabalham de forma voluntária, além de bolsas de estudos para os alunos. A escola conta também doações de terceiros e, como funciona em caráter de cooperativa, recebe colaboração dos próprios alunos. "Aquele que tem mais recursos termina ajudando com a compra de comida, ou fazendo vaquinhas para a compra de equipamentos, como o fogão que acabaram de adquirir para a cozinha da escola", diz Francisco. Muitos dos estudantes, em função do horário - as aulas vão das 12h às 17h - e da necessidade financeira almoçam na própria Mocha Celis.

Sarmiento maquiado num cartaz da Escola Mocha Celis

 

Inspiração brasileira 
O principal objetivo de uma escola popular como a Mocha Celis é integrar conteúdos de maneira a promover o maior intercâmbio de conhecimento possível. Por isso, na única sala de aula existente até o momento na escola as cadeiras estão dispostas ao redor de uma mesa central, onde se sentam alunos e professores, sem nenhum tipo de ordem hierárquica. E a grande inspiração para esse método de educação vem do Brasil, dos preceitos de Paulo Freire. "Nós tomamos um pouco do Brasil, a ideia de educação popular vêm daí. Nós inspiramos muito nos métodos de ensino do Movimento dos Sem Terra, por exemplo. Aqui na Argentina se trabalha também dessa maneira na Educação Popular formal. A ideia é dar um título para que depois a pessoa possa seguir os estudos, sem desvalorizar a autogestão", explica Francisco.

Quanto ao currículo escolar, além das matérias regulares do ensino médio, os alunos recebem orientação para o cuidado com a sua saúde sexual e aprendem um pouco sobre a história do movimento transexual, em uma disciplina chamada História e Memória do Reconhecimento Trans. Mas, para além de toda a proposta pedagógica diferenciada, que já faz parte de muitas outras instituições de ensino popular na Argentina, o que a escola aberta Mocha Celis pretende é promover um ambiente de integração e identificação entre seus estudantes. "Uma das nossas premissas é fugir do chamado currículo oculto das escolas tradicionais, que diz que meninos devem se vestir de azul e meninas de rosa", explica o coordenador.

Já em seu cartaz de divulgação, a Mocha Celis traz uma mensagem importante: o objetivo de romper com o molde Sarmientista de Educação. Sarmiento foi presidente da Argentina durante o século 19 e ficou conhecido por seu investimento em educação pública, bem como suas teorias estritas sobre o tema. No cartaz, o político aparece travestido, com os lábios pintados de vermelho, brincos e maquiagem. "Sarmiento assim como criou muitas escolas, criou também a teoria das pombinhas brancas, em que os alunos deveriam ir à escola todos iguais em uniformes brancos. Seu objetivo era uniformizar as pessoas, deveriam sair da escola como uma máquina de reproduzir conteúdo. Civilizadas, como diria ele, e tudo que fosse diferente a isso deveria ser eliminado. É esse tipo de pensamento a respeito da educação com o qual nós queremos romper", teoriza Francisco.

As alunas 
Em uma situação social na qual a expectativa de vida é de 35 anos, as travestis ou transexuais vivem à margem não somente da educação regular, mas também de recursos como saúde e moradia. Uma instituição como a Mocha Celis tem, antes de qualquer coisa, o caráter emergencial de resolver um problema social que não pode driblar o preconceito. Em 2006, o governo federal criou uma lei, a 26.150, que previa a obrigatoriedade da educação sexual nas escolas. Como no país cada Estado tem autonomia para gerenciar o setor de educação, a ideia não vingou nos lugares onde o catolicismo está mais presente. Assim, a discriminação contra aqueles que não cumpriam os requisitos para a "normalidade" foram sendo cada vez mais excluídos do sistema escolar.

"A única coisa que a escola fazia era chamar meus pais e dizer-lhes que eu estava sempre no grupo das meninas ou perguntar por que eu me travestia, eles buscavam sempre uma desculpa para me expulsar da escola, pelo simples fato de eu ser homossexual", conta Celeste Alvellaneda, sobre seus anos na educação regular. Apenas hoje, aos 24 anos de idade, ela pode retomar os estudos deixados quando se transferiu do Estado de Salta para tentar a vida na capital portenha. Celeste conta que, além da violência que sofria na escola, onde foi literalmente apedrejada, guarda o trauma de haver pensado que o seu comportamento diferente teria sido o principal estopim da separação dos pais "isso gerou uma confusão com a minha família, mais tarde meus pais se separaram e eu pensei que a culpa era minha porque me vestia e me comportava como uma mulher", desabafa.

Já sua colega, Solange Fabian, empregada doméstica de 28 anos, conta que atualmente não sofre tanta discriminação quanto na pré-adolescência, mas não deixa de admitir a necessidade de escolas como a Mocha Celis. "Por um lado não me parece correto que tenha que existir uma escola a parte, porque isso significa que a sociedade faz com que nos afastemos do que é o estabelecimento escolar masculino/feminino. E por outro lado, eu acho ótimo, porque eu me sinto confortável, estou com meninas que estão na mesma situação que eu", diz.

Como um dos objetivos da instituição é fugir do estigma do preconceito, ela é apenas direcionada aos transexuais, mas podem estudar estudantes de qualquer orientação sexual.

A homofobia na Argentina 
A criação de uma escola direcionada para travestis traz consigo a pergunta: a separação dos transexuais em uma escola especial em lugar de gerar sociabilidade não acabaria por criar um gueto? "Nós também defendemos e queremos a escola pública, mas vamos obrigar outra vez, talvez por uma sexta ou sétima vez, as estudantes a voltarem para uma escola que vai expulsá-las novamente? Se o modelo da escola tradicional não muda, seria violentar mais uma vez esses corpos, essas identidades, obrigando-as a ter mais um fracasso no seu currículo, voltando a não acreditar no sistema educacional", responde Francisco.

Quanto a essa questão, o coordenador do LGBT Argentino, Esteban Paulón, declara: "A enorme exclusão e dificuldade de inserção das pessoas Trans nas escolas faz com que abordagens como a de Mocha Celis seja totalmente válida e nós do movimento apoiamos totalmente".

A Argentina é um país bastante avançado no que diz respeito à conquista de direitos para a comunidade LGBT. Eles foram os primeiros na América Latina a aprovar o Casamento Igualitário entre pessoas do mesmo sexo. Porém, no que diz respeito à discriminação no ambiente escolar, ainda há muito no que avançar.

O governo, com a colaboração da LGBT da Argentina, criou a lei 26.150 em 2006, a qual prevê o ensino da educação sexual integral em todas as intuições da rede pública. A medida não teve um resultado efetivo, como conta Esteban Paulón. "Foi feito o debate com várias organizações sobre esse material, mas tornou-se quase impossível incluir esses conteúdos nas escolas porque, como a sua implementação é incumbência de cada estado, houve uma forte resistência na sua aplicação".

Esteban diz que ainda falta muito que discutir sobre a permanência da população Trans na escola, especialmente durante o ensino médio, quando os estudantes estão descobrindo a sua sexualidade. Essa é a fase em que o transexual começa a ter consciência da sua identidade sexual e acaba sendo alvo de preconceito, que pode vir em forma de bullying, ou mesmo violência física.

 

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imagem de sonara vieira da costa

 EU ACHO QUE PARA EVITAR UMA

 EU ACHO QUE PARA EVITAR UMA EXCLUSÃO SOCIAL Ñ É SE CRIANDO ESCOLAS PARA HOMOSSEXUAIS QUE VAI ADIANTAR ALGUMA COISA, TEM QUE SE COMESSAR DENTRO DA ESCOLA COM A EDUCAÇÃO SE DESDE DE PEQUENO AS CRIANÇAS SABEREM QUE Ñ DEVEM TER PRECONCEITO ELAS Ñ TERAM NO FUTURO, E ASSIM Ñ HAVERA PRECONCEITO.

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