Homofobia, Ibope e os avanços na opinião pública no Brasil

A pesquisa do Ibope Inteligência sobre atitudes da população brasileira em relação a lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT), publicada no último dia 28 de julho, traz alguns dados muito reveladores sobre a evolução da opinião pública a este respeito.

Há 18 anos foi publicada outra pesquisa do Ibope em relação ao mesmo assunto. Em 1993, segundo aquela pesquisa, 44% não mudariam sua conduta com o colega se soubessem que era homossexual. Pesquisa de 2008, também do Ibope, indicou que 65% aceitariam. Já em 2011, 73% dos entrevistados não se afastariam se descobrisse que um amigo é gay. Em 1993, 55% não trocariam de médico se descobrissem que era gay. Hoje, 67% são totalmente a favor de médicos homossexuais no serviço público. No que diz respeito à revelação de um(a) amigo(a) ser gay ou lésbica, 80% das mulheres, 81% dos jovens de 16 a 24 anos e 85% das pessoas com nível superior de escolaridade não se afastariam.

É muito alentador observar que, segundo a nova pesquisa do Ibope, 52% das mulheres, 50% dos católicos, 60% dos jovens de 16 a 24 anos e 60% dos com nível superior são favoráveis à união estável entre casais homoafetivos. Em 1993, o assunto nem tinha entrado na pauta do legislativo ou do judiciário, tanto é que a pesquisa do Ibope daquela época nem perguntou sobre isso. No entanto, tínhamos acesso a outras pesquisas que apontavam que havia apoio de apenas 7% da população a esta forma de união. Hoje 45% da população estão a favor.

Vale lembrar que em 1995, existiam apenas 35 grupos LGBT organizados e nenhuma organização nacional. Não havia nenhuma Parada LGBT. Hoje o panorama mudou: há 9 redes nacionais LGBT, pelo menos 250 Paradas LGBT e mais de 300 ONG LGBT em todo o Brasil. Sem dúvida, a organização política do segmento tem contribuído em muito para as mudanças favoráveis que vêm ocorrendo na opinião pública. Neste ano de 2011 vamos para a II Conferência Nacional dos Direitos Humanos da Comunidade LGBT, convocada pela presidenta Dilma Rousseff, que será precedida por Conferências Estaduais LGBT convocadas por todos e todas os(as) governadores(as). Nestas Conferências avaliaremos todas as políticas públicas existentes em nosso país contra a violência e a discriminação e pela cidadania das pessoas LGBT.

Também com base na nova pesquisa, pode-se afirmar que as atitudes homofóbicas têm suas raízes em valores machistas da nossa cultura, na intolerância de certos setores religiosos e na falta de acesso a informações corretas sobre a homossexualidade: 63% dos homens, 77% dos evangélicos e 68% dos com estudo até a 4ª série do ensino fundamental afirmaram ser contrários à união estável entre casais homossexuais. Mesmo aqui há uma evolução se compararmos com a Idade Média, quando éramos queimados na fogueira pela Santa Inquisição, inclusive ainda há 7 países com pena de morte para os homossexuais. Depois a homossexualidade foi considerada crime em muitos países, e ainda há ainda 75 onde ser gay é crime. E no Século XX, até o dia 17 de maio de 1990, a homossexualidade era considerada uma doença pela Organização Mundial da Saúde. Estamos, sim, avançando muito.

Seria muito interessante ter outra pesquisa desta natureza daqui a 10 anos. Se continuar na mesma tendência de aumento de respeito às pessoas LGBT, em especial entre os jovens, o Brasil não será mais um país em que uma pessoa LGBT é assassinada a cada dois dias, e sim um país de respeito e aceitação da diversidade sexual. Para isso, nas palavras de Tony Blair, é preciso três coisas: educação, educação e educação, assim como investimento em políticas públicas.

Além de investir firme na educação e em políticas públicas, o movimento LGBT precisa aprimorar sua parceria com a juventude e com as mulheres, tendo em vista que são o público que mais nos apoia. Também é preciso abrir uma frente de diálogo com os 50% dos católicos, os 23% dos evangélicos e os 60 % de outras religiões que nos respeitam, para que semeiem a boa nova da Constituição Federal, principalmente os artigos 3º e 5º que estabelecem que todos são iguais perante a lei e que não haverá discriminação de qualquer natureza em nosso país, assim como fez o Supremo Tribunal Federal, que, numa decisão histórica e unânime, no dia 5 de maio de 2011, disse não à discriminação, e julgou a favor do reconhecimento da união estável entre casais homoafetivos, com base nos princípios da liberdade, da segurança jurídica, da igualdade de direitos e da laicidade do Estado.

Seguindo a filosofia de Aristóteles, quando fala que a finalidade da vida é a felicidade, no último dia 19 de julho a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou uma resolução para que os governos deem mais importância à felicidade e ao bem-estar na elaboração de políticas públicas para alcançar e medir o desenvolvimento econômico e social. O reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo e o respeito à cidadania pode contribuir muito para a felicidade de milhares de cidadãos e cidadãs LGBT no Brasil.

*Toni Reis é presidente da ABGLT – Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais e conselheiro do Conselho Nacional de Lésbicas, Gays. Bissexuais, Travestis e Transexuais.

Sobre o tema, conheça:

- Pesquisa "Diversidade Sexual e Homofobia no Brasil: Intolerância e respeito às diferenças sexuais", realizada em 2009 pela Fundação Perseu Abramo em parceria com a Fundação Rosa Luxemburgo Stiftung (RLS).

- Livro "Diversidade Sexual e Homofobia no Brasil", de Gustavo Venturi e Vilma Bokany (Orgs.), publicado pela Editora Fundação Perseu Abramo, em 2011

Fonte primária: Site ABGLT, em 02/8/2011

Fonte secundária: Fundação Perseu Abramo

 

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imagem de Rosemary da Silva Granja

O que é pessoal é também político!

Obrigada  pela postagem do seu texto! É realmente animador saber que a tolêrancia do brasileiro com a diversidade sexual está aumentando. Fica claro que a educação é o principal motor das mudanças verificadas... por isso há que se intensificar a informação e a visibilidade. Nesse campo ainda persiste o tabu e silêncio. 
Vale mencionar aqui um fato interessante. Na semana passada, alguém que visitou esta comunidade e meu perfil no Facebook perguntou: "Por que você se envolve com a causa dos gays? Não tem medo de sofrer preconceito no trabalho ou receber um coió?  Não tenho nada contra os veadinhos, mas não vou me meter. Não sou  gay..."
Bem, essa pessoa tocou em uma questão sobre a qual tenho pensado muito: é preciso ser homossexual para desejar e lutar pela igualdade de direitos? Estaria eu metendo colher em cumbuca alheia? Que papel devem ter  os heteros que compõem "S" do GLS? Oferecer simpatia distante?
Penso, cada vez mais, que essa discussão  diz respeito a toda sociedade, não só porque precisamos fazer valer o princípio da igualdade, independente da opção sexual de cada, mas principalmente porque vivemos todos sob o peso de prescrições normativas que ditam escolhas e comportamentos em todos os campos da vida humana. Por exemplo, porque eu não poderia flertar com um visual masculino ou gay sem ser ter minha sexualidade questionada?  É preciso deixar claro que há muitas maneiras de ser mulher ou homem... a heterossexualidade, a homossexualidade, bissexualidade  –  ou qualquer outra forma de sexualidade  -  são  apenas uma parte daquilo  que nos faz ser quem somos.
Qualquer conquista LGBT é, sob muitos aspectos, conquistas de todos! 
Abraço

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imagem de dalva ribeiro vieira

Homofobia, ibope e os avanços da opinião pública no Brasil.

É interessante perceber que a opinião pública tem mudado a esse respeito, que, cada vez mais, as pessoas estão mais abertas no sentido de aceitar as diferenças. Todavia, bom mesmo será quando não precisarmos falar de porcentagens. Quando todo mundo entender que todo mundo tem o direito de ser como desejar. Quando o respeito pelo próximo for maior do que qualquer preconceito.

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