Na ponta da língua

Vencedora e apresentadores do "Show do Milhão Ortográfico"Professora de Belo Horizonte utiliza os meios de comunicação para trabalhar o letramento. "Para mim é importante que o aluno consiga compreender a própria realidade", afirma.

  

"O fato de bem-te-vi estar com hífen é porque designa uma espécie zoológica", explica a aluna Laís Eugênio, de 16 anos. "E é uma palavra composta", completa a professsora. A explicação é parte do Show do Milhão Ortográfico, organizado pelos alunos da turma 215, do segundo ano do Ensino Médio da Escola Estadual Santos Dumont, em Belo Horizonte. Orientados pela professora Clara Bortoloto, de português, os estudantes tiveram que construir atividades diferentes para explicar as novas regras do acordo ortográfico da língua portuguesa.

O grupo de Laís optou por um jogo interativo aos moldes do programa de televisão. Os apresentadores fizeram perguntas relativas ao uso do hífen nas novas regras, e foram surpreendidos pelo conhecimento dos colegas. Ao fim da brincadeira, a vencedora Isabela Ferreira, de 15 anos, ganhou um milho como prêmio, para diversão de toda turma.

Preparação

Até chegar na apresentação do trabalho, os alunos passaram por várias etapas. Primeiro, a professora Clara recomendou que fizessem uma pesquisa na internet e na biblioteca sobre as novas regras. Em seguida, juntos, fizeram uma análise para comparar como ficam as palavras depois da mudança. Só então, os grupos puderam preparar suas apresentações. "Para mim, o importante nem sempre é o resultado, mas o processo. O aluno tem que pesquisar, pensar sobre o tema", explica Clara.

O trabalho da professora integra o projeto "Letramento e Vida: comunicando - A linguagem como instrumento de comunicação", desenvolvido desde 2004. No projeto, são trabalhados diversos gêneros textuais em circulação na sociedade, como jornais, revistas, propagandas, sites,vídeos, entre outros. "A gente pede pro aluno verificar em que condições foi escrito o texto, qual o público-alvo, como ele se estrutura, depois ele reescreve esse texto de acordo sua realidade".

Em 2008, por exemplo, os alunos fizeram um extenso trabalho para analisar os elementos de contos de fadas, como narrador, espaço, tempo e personagens. Na hora de recontar as histórias, os alunos transformaram Cinderela em participante de reality show e os Três Porquinhos tiveram que se adaptar à regras de sustentabilidade para construir suas casas,mantendo a estrutura consagrada dos contos.

Clara explica que procura fugir da abordagem tradicional do português na sala de aula. "Não gosto de chegar em sala, mandar o aluno abrir o livro na página tal e pedir que ele responda um questionário. Para mim é importante que o aluno consiga compreender a própria realidade". Ela conta com orgulho que seus alunos costumam sair muito bem em redações do vestibular. "Eles compreendem tanto os gêneros textuais, que quando vão fazer a prova, não precisam lembrar da fórmula decorada introdução/desenvolvimento/conclusão", afirma Clara.

E os estudantes aprovam esse tipo de trabalho. O grupo de Tamara Fernandes, 15 anos, criou o telejornal Português Brasil para noticiar as mudanças na língua portuguesa. Enquanto dois âncoras anunciavam as novidades, "repórteres" espalhados pela sala de aula explicavam porque "assembléia" perdeu o acento agudo e o trema desapareceu completamente. Tamara considera importante que os próprios alunos pesquisem o que vai ser apresentado. "É que pra passar para os colegas, a gente tem que saber um pouco mais", diz a estudante.