Será, de fato, a unanimidade burra?

O fracasso no Ibope da microssérie A Pedra do Reino: talvez seja pra bem

Ariano Suassuna afirmava que a Pedra do Reino era uma “obra mais individualista, mais complexa, mais difícil [...] é a obra na qual me expressei de maneira mais completa.” Portanto, quando lhe perguntavam que obra sua ele indicava para um jovem ler, ele respondia de pronto: “para uma pessoa pouco habituada à leitura eu indicaria O Auto da Compadecida. Já para um jovem com interesses literários, eu recomendaria A Pedra do Reino.”

Vejamos se esta opinião de Ariano pode explicar o que aconteceu com a audiência da adaptação da sua obra A Pedra do Reino para a televisão.

Entre 12 e 17 de junho de 2007, em comemoração dos 80 anos do escritor, foi ao ar a microssérie A Pedra do Reino, adaptada a partir do livro O Romance d'A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta. A microssérie trouxe para a TV os traços do trabalho peculiar de Luiz Fernando Carvalho, já demonstrados em produções como hoje é dia de Maria.

O “romance-memorial-poema-folhetim”, como definiu Carlos Drummond de Andrade, como grande parte da obra de Ariano Suassuna, é baseada na cultura popular nordestina, mantendo, portanto, traços similares aos da literatura de cordel, dos repentes e das emboladas. No entanto, ali estão também os aspectos da cultura medieval, do qual a obra mais conhecida é o Auto da Compadecida. Ariano dedicou a obra ao pai e a mais doze “cavaleiros”, entre eles: Euclides da Cunha, Antônio Conselheiro e José Lins do Rego, ou seja, ícones da cultura popular nordestina.

Pedra do Reino retratou o mito do sebastianismo no Brasil, já que a obra de Suassuna é inspirada em um episódio ocorrido em 1836, no município de São José do Belmonte, em Pernambuco, onde uma seita tentou fazer ressurgir o rei Dom Sebastião.

A adaptação de Luiz Fernando Carvalho prima pela originalidade, mas tudo é cuidado para não destoar da proposta de Ariano. A trilha sonora, por exemplo, é centrada nos sons medievais das rabecas e dos violinos e do som típico dos pífaros nordestinos. O figurino, o cenário, a fotografia, tudo obedece à mescla entre a cultura popular nordestina e a cultura cristã medieval, marca de Suassuna.

Quando perguntaram para Ariano o que ele achou da adaptação, ele respondeu que o diretor Luís Fernando havia conseguido superar o desafio de adaptar um romance para a TV. “Ele venceu. Tudo o que coloquei no romance tava lá. Eu tive a impressão que o público, por causa do sucesso de Auto da Compadecida, esperava uma outra Compadecida…. Mas é completamente diferente. Não tem a leveza da comédia. [...] Gostei muito, mas acho que o público ficou absolutamente indiferente, não gostou muito. Os espetáculos são muito bonitos. Mas o grande público estranha.”

Na época, a microssérie foi acusada de hermética, e abandonada pela maior parte do público das telenovelas. Em compensação, foi abraçada pela crítica, que avaliou essa releitura como um marco da teledramaturgia, embora o público não tenha recebido bem a proposta.

Portanto, Ariano estava certo quando evitava indicar esta obra para um não iniciado...rs Por outro lado, levando-se em conta o fato de Ariano ter gostado da adaptação, dela ter sido um fracasso no ibope, e o que dizia o saudoso dramaturgo carioca, de que “toda unanimidade é burra”, talvez seja hora de darmos uma espiada nesta minissérie...rs e, quem sabe, nos motivarmos para ler as seiscentas páginas do livro...rs não é mesmo?!

Colocamos como capa deste post a abertura da microssérie.

Boa degustação cultural!

 

Referências:

http://www.cartanaescola.com.br/single/show/379

http://divirta-se.uai.com.br/app/noticia/arte-e-livros/2014/07/23/notici...

Comunidades: