O SENTIDO DO "FAZER CIÊNCIA"

COLÉGIO ESTADUAL PADRE CLÁUDIO MORELLI – Ensino Fundamental e Médio
PACTO PELO FORTALECIMENTO DO ENSINO MÉDIO
ETAPA II

REFLEXÃO EM AÇÃO – CADERNO III – Ciências da natureza

SENTIDO DO “FAZER CIÊNCIA”

Se é possível dizer que o conhecimento liberta o ser humano de seus grilhões, também é possível dizer que o mesmo conhecimento pode o aprisionar. Desde o Iluminismo o primeiro princípio ganhou força e verdade. Mas é com Marx e o pensamento da esquerda que se segue a partir dele, o segundo princípio também recebeu seu peso.
O conhecimento considerado válido, o verdadeiro, historicamente, esteve quase sempre aliado ao poder. Em outras palavras, havia um certo tipo de saber popular, prático, manual, sem exigências abstracionais ou acesso privilegiado ao mundo espiritual que esteve nas mãos dos comuns. Por outro lado, um conhecimento mais elevado, carregado de mistérios e raciocínios complexos, esteve aprisionado nas mãos de sacerdotes, sábios e poucos que terminaram por determinar verdades, sentenças, tratamentos.
Tais saberes, os verdadeiros, também permitiram ao ser humano grandes descobertas, invenções e construções arquitetônicas e tecnológicas consideráveis. Com o surgimento da filosofia, esse conhecimento passou a residir a praça pública. De alguma forma, o cidadão grego apropriou-se da complexidade. Ainda restrita às exigências políticas da época, o conhecimento alçou ares de discussão pública. Assim, foi possível a reflexão, sistematização e publicação de algum tipo de saber passível de divulgação e compreensão por um maior número de pessoas. É a partir desse fato, filosofia, que podemos determinar um certo modo de desenvolvimento da ciência, entendida aqui, como domínio e sistematização do saber, através do uso da razão, do argumento, da lógica e da observação cuidadosa e sistemática dos fenômenos da natureza.
Foi a partir do século XV e XVI, principalmente com Francis Bacon e o “Novo Organon”, que o conhecimento filosófico parecer conhecer seus filhos distintos. A implementação do método experimental, a divisão dos conhecimentos em áreas específicas foi flexionando a filosofia para o lado da reflexão teórica e a Ciência, propriamente dita como pesquisa metodológica, com objeto específico, foram encontrando seu espaço.
As ciências e seus resultados, não resta dúvida, trazem à sociedade benefícios indiscutíveis. São bem visíveis também os resultados para o meio ambiente e para a saúde do ser humano alguns resultados mais trágicos. Paradoxalmente, porém, se no despertar grego o conhecimento desceu à praça pública, no desenvolver da ciência moderna o conhecimento voltou a ficar sacralizado, agora nos laboratórios, restrito a poucos. E o conhecimento não conseguiu se despir da áurea de poder. Isso quer dizer que, mesmo com todos os avanços, o conhecimento que poderia libertar o ser humano de seus grilhões econômicos, políticos, ideológicos, não conseguiu tal intento. Do contrário, como demonstrou Marx e os marxistas, um certo saber foi utilizado como forma de dominação política e econômica.
Mais tarde, por outro viés, Michel Foucault, demonstrou como essa amarra entre saber, ciência, verdade e dominação, encontrou seus meandros mais obscuros nos cárceres, internatos, hospitais e nos discursos de uma forma geral.
O que tudo isso significa para nós da escola? Minimamente, que precisamos nos dar conta dos diversos caracteres escondidos por trás dos discursos e práticas científicas. Uma vez que a escola tenha se tornado um dos lugares de acesso aos saberes organizados e tradicionalmente reconhecidos como importantes para a “libertação” do ser humano, como forma de participação e cidadania. Talvez a escola, esteja fazendo exatamente o contrário e exatamente o que se verifica a séculos: emplacar um certo tipo de conhecimento mínimo, prático, manual, rasteiro para trabalhadores, outro tipo de conhecimento para comandantes das áreas econômicas e políticas, e um terceiro tipo de conhecimento científico das esferas mais avançadas do conhecimento.
Entretanto, tal realidade perversa não é, necessariamente, tão macabra quanto pode-se pintar. Com o advento da internet e as redes sociais, os conhecimentos, de uma forma geral, passaram a ter uma nova “praça pública”. De alguma forma, não há mais segredos. Tudo está nas redes. Tudo está disposto. Basta acessar. Eis um dilema: se está disponível ao clique rápido de um mouse, não há porque buscar. E a preguiça mental parece tornar essa nova praça, acessível apenas para diversão. E o conhecimento volta a ficar restrito à poucos.
Resta a questão: como incentivar à pesquisa? Como provocar o estudante para ser o sujeito do saber?
Será preciso, segundo o que foi discutido em nossos encontros, desfazer mitos, tais como: a ciência como verdade definitiva; ciência como ordenamento lógico do conhecimento; ciência como desenvolvimento linear na história; ciência como conhecimento sacralizado e indiscutível; unicidade dos procedimentos metodológicos de pesquisa; discrepância inegociável entre religião e ciência; ciência isenta de interesses econômicos e políticos;
Será preciso levar em conta algumas atitudes pedagógicas que permitam reconhecer novas formas alternativas de pesquisa e de iniciação à pesquisa científica, tais como:
a)  não cair na tentação de reduzirmos nossas práticas pedagógicas à mera INFORMAÇÃO. No geral, tanto as aulas quanto as pesquisas solicitadas pelos professores, acabam sendo transformadas em repasses e troca de informações, sem reflexão, absorção de seu sentido e significado;
b) Trabalhar com a problematização instigativa, provocativa. Não reduzir os conteúdos e metodologias a uma mecânica sem que o estudantes e o professor fiquem à margem da discussão e reflexão crítica sobre os conceitos;
c) Elaborar metodologias de pesquisa alternativas. O método científico experimental não se constitui o único modelo de pesquisa científica. Os modelos apresentados pelas ciências humanas (Antropologia, Sociologia e outras) também podem ser alternativas para a iniciação à pesquisa;
d) Elaborar projetos e iniciação à pesquisa científica. O colégio poderá estimular a pesquisa promovendo feiras e saraus científicos para que a pesquisa seja inserida no cotidiano escolar;
e) Utilização do contraturno para atividades complementares de pesquisa;
f) Ensino experimental;
g) Revisão e formação para os professores sobre o sentido e o significado da pesquisa e da pesquisa interdisciplinar;
h) Superação da metodologia por projetos, onde a interdisciplinareidade fica restrita;
i) Construção de laboratórios de ciência, matemática e física;
j) Repensarmos a lógica da educação da quantidade pela qualidade da experimentação de conteúdos.
Como sugestão de proposta de pesquisa investigativa, interdisciplinar e contextualizada, sugerimos um trabalho a respeito do uso do narguile. Esse produto vem sendo utilizado com muita frequência pelos nossos estudantes, muitas vezes apoiados pela família. Não sabemos, mesmo entre os professores, se há ou não malefícios, seus alcances, sua legalidade, sua origem geográfica.

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