Minhas tardes com Marguerite

Germain é um cinquentão quase analfabeto. Marguerite é uma senhora apaixonada por livros. Quarenta anos e muitos quilos os separam. Um dia, por acaso, ele senta ao lado dela em um banco no parque. Ela recita em voz alta versos dando assim, a ele a chance de descobrir a magia dos livros, que nunca fizeram parte de sua vida. Mas Marguerite está perdendo a visão e pelo carinho e afeto que serão criados dessa relação, Germain irá aprender a ler, para mostrar que pode fazer, quando ela não puder mais.

Minhas Tardes com Margueritte (La Tête en Friche) atende ao requisito básico: ensinar o respeito ao idoso e, por tabela, proteger uma certa tradição cultural francesa contra as diluições do século 21.

O quarentão Germain (Gérard Depardieu) é um feirante da cidade de Pons. Mora com a mãe, relaciona-se com uma mulher mais nova, motorista de ônibus, e bebe com os amigos de trabalho. Durante suas folgas, Germain se senta em uma praça para comer um sanduíche, e numa dessas conhece a nonagenária Margueritte (Gisèle Casadesus). É ela que, pela literatura de Albert Camus e Romain Gary, todas as tardes, ensina Germain a ser menos tosco.

Evidentemente, o diretor e roteirista Jean Becker tem um propósito nobre para essas aulas de literatura: ajudar o feirante a lidar com sua infância problemática, com sua mãe senil, enfim, a conhecer-se melhor. Na prática, porém, o supletivo de Margueritte afasta Germain da realidade que ele conhecia - os imigrantes que compõem a mão de obra barata da França - e ainda associa essa realidade aos problemas do mundo (o horror dos noticiários da TV na casa da mãe, por exemplo).

Becker não é o único realizador francês a atender à demanda "burguesa" dos seus compatriotas que enxergam na França miscigenada um perigo. Minhas Tardes com Margueritte funcionaria bem dentro dessa chave protecionista - Depardieu está à vontade no papel - se o arco de Germain não fosse tão raso. É um filme sem conflitos; o protagonista se dispõe a passar por uma transformação sem esboçar (ou enfrentar) qualquer obstáculo.

E aí fica perfeitamente claro que Minhas Tardes com Margueritte não é um filme que prega respeito, e sim piedade.