Documentário ' Escolarizando o mundo.'

Depois de assistir ao documentário Escolarizando o mundo – o último fardo do homem branco, responda a pergunta: Você perdeu o sono? Se sim, saberemos que trabalha com educação, pois não há como assisti-lo e sair incólume dessa experiência. E mesmo para quem não trabalha diretamente na área, eis aí uma produção que dá o que pensar.

Não se trata de algo novo. Na realidade, o documentário é uma produção de 2011. A novidade é que ele se encontra disponível agora no YouTube, legendando em português,  o que o tem feito circular como referência pelas redes sociais e gerar inúmeros comentários, sobretudo em grupos de professores e outros profissionais envolvidos com educação. 

Vale conferir. O filme é uma co-produção americana e indiana. Dirigido e editado por Carol Back, aborda de forma contundente o fato de a educação escolar ter servido, ao longo dos últimos séculos, à colonização e estar servindo, atualmente, à homogeneização cultural. Em outras palavras, com o documentário se mostra um lado perverso da educação para o qual nem sempre voltamos os olhos: a possibilidade de, se mal utilizada, a escola servir à extinção das culturas e à perda da diversidade cultural.

Nem sempre a educação e a boa vontade dos educadores se prestam à emancipação e à autonomia. Aliás, esse é um dos aspectos analisados no filme que mais chamam a atenção: em todo o mundo são frequentes ações voluntárias de organizações não governamentais ou de indivíduos bem intencionados em prol da educação de populações locais. Nem sempre, no entanto, essas ações vêm acompanhadas da plena consciência do processo mais amplo em que estão inseridas e que, em geral, envolve a espoliação de territórios e a desvalorização de saberes tradicionais.

Escolarizando o mundo foi filmado, principalmente, em Ladakh, região situada no sudeste da Ásia e conhecida como ‘pequeno Tibet’, palco de disputas políticas entre Índia, Paquistão e China, em uma região do Himalaia (a parte oriental e sob controle indiano) onde a cultura budista tibetana luta por manter vivas as suas tradições e a sua língua original. É com base, portanto, no que vem acontecendo em Ladakh, mas não apenas restrito a esse local, que o filme procura tornar explícitas as premissas ocultas por trás de projetos de escolarização em andamento em várias partes do mundo. Entre elas, destaca-se a falsa ideia de que os valores e o modo de vida ocidental são superiores e absolutos, vias de acesso garantido para uma vida melhor.

Como revela o documentário, não necessariamente essas promessas são verdadeiras e, na maior parte das vezes, mostram-se fábulas irreais. Muitos jovens têm sido apartados de suas localidades e se deslocado para os grandes centros urbanos, deixando para trás suas famílias e raízes culturais. Os efeitos desse processo são muitos e danosos: vão desde a desistência da agricultura ou a sobrecarga de trabalho para mulheres e idosos, que se veem deixados para trás pelos jovens que migram, até o abandono desses mesmos jovens, que se veem desempregados ou subempregados em grandes centros urbanos, em uma situação limítrofe de recusa e crítica a sua própria cultura e de não assimilação da cultura idealizada.

Ou seja, longe de cumprir as promessas anunciadas, a disseminação dos valores e do modo de vida ocidental entre populações autóctones, promovida deliberadamente por meio da escolarização, tem levado em muitos casos à destruição das identidades locais e à homogeneização cultural humana.  A troca dos modos de vida tradicionais pela adoção de uma cultura de subempregos escassos em sociedades urbanas e de consumo, cuja ênfase encontra-se apenas no sucesso material, tem, portanto, um altíssimo custo para essas populações, defende o documentário.

Em Escolarizando o mundo, as imagens são o recurso mais valioso usado pelos produtores para chamar nossa atenção para o contraste entre os modos de vida locais e o modo de vida global, proposto atualmente. Imagens lindíssimas da região da cordilheira do Himalaia (e que envolvem também cenas do modo de vida tradicional lá praticado) contrastam com as de grandes cidades, para onde os jovens migram em busca de escolarização, ascensão social e poder de consumo.

O artigo na íntegra e o link de acesso ao documentário pode ser acessado a partir do site: http://cienciahoje.uol.com.br/alo-professor/intervalo/2014/01/escolarizando-o-mundo